por Marina Bairrão Ruivo

Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992), pintora de origem portuguesa, nasceu em Lisboa, no seio de uma família que cedo estimulou o seu interesse pela pintura, pela leitura e pela música, filha única de Marcos Vieira da Silva e Maria da Silva Graça. Os três primeiros anos da sua vida são pontuados por viagens a França e Inglaterra, e em 1910, a doença do pai leva-os a Leysin, na Suíça. Após a morte do pai, em 1911, Vieira e a mãe regressam a Portugal onde cresce num ambiente intelectualmente rico mas frequentado quase exclusivamente por adultos. No final do Verão de 1913, depois de uma estadia de dois meses em Inglaterra marcada pela descoberta dos museus e do teatro de Shakespeare, Vieira recorda ter decidido tornar-se pintora. Depois de ter estudado desenho, pintura e escultura em Lisboa, vai para Paris em 1928, insatisfeita com o ensino ministrado na Escola de Belas Artes de Lisboa, num período politicamente instável face ao avanço do fascismo e culturalmente pouco estimulante. Em Paris deslumbra-se com a agitação da capital francesa num período rico na partilha de ideias por parte de artistas plásticos, escritores, músicos e bailarinos. Frequenta espectáculos, museus e galerias. Hesitando entre pintura e escultura, frequenta na Academia da Grande Chaumière as aulas de escultura de Bourdelle que era, à época, assitido por Germaine Richier e Alberto Giacometti, e de Despiau na Academia Scandinave, abandonando esta técnica em 1929 para se dedicar exclusivamente à pintura. Trabalha então com Dufresne, Waroquier e Friez e inicia-se na gravura no Atelier 17 de Hayter onde se concentra nas pesquisas de representação do espaço. Frequenta também as aulas de Fernand Léger e de Bissière nesta fase de intensa descoberta e experimentação. No Verão de 1928 faz uma viagem de estudo a Itália que vai marcar definitivamente as suas pesquisas plásticas, ficando especialmente impressionada com Siena e a pintura pré-renascentista. Em 1930 casa-se com o pintor de origem húngara, Arpad Szenes (1897-1985), que conhecera na Academia da Grande Chaumière, perdendo a nacionalidade portuguesa. Torna-se pouco depois apátrida quando por sua vez Arpad Szenes perde a nacionalidade húngara. Pintora de temas essencialmente urbanos, a sua pintura revela, desde muito cedo, uma preocupação com o espaço e a profundidade. Em 1932 conhece Jeanne Bucher, que desempenha um papel decisivo na sua carreira, iniciado com a organização da sua primeira exposição individual no ano seguinte. É por seu intermédio que Vieira da Silva descobre a pintura de Torres-García que a marca profundamente. Em Portugal, as suas obras são vistas pela primeira vez em 1935, na Galeria UP, numa exposição organizada por António Pedro. No ano seguinte, Vieira da Silva expõe com Arpad Szenes no seu atelier de Lisboa. Num momento em que se teme o crescimento do fascismo na Europa, o casal reúne-se regularmente, até ao início da Segunda Guerra, no Café Raspail, com um grupo de artistas e intelectuais de esquerda, para discutir arte e política sob o nome de «Amis du monde». Em 1938 abandona a Villa des Camélias – residência do casal desde 1930 - e instala-se na casa-atelier do Boulevard Saint-Jacques onde convive com Alberto Giacometti, Jean Lurçat, Jacques Lipchitz, e Etienne Hajdu, entre outros. Em 1939, pressionada pelas circunstâncias, deixa Paris, ficando os seus trabalhos e atelier à guarda de Jeanne Bucher. Após uma curta temporada em Lisboa onde Vieira tenta, em vão, reaver a nacionalidade portuguesa e que esta seja atribuída ao marido, parte com Arpad para o Brasil em 1940 onde permanece até 1947. O casal fixa-se na Pensão Internacional, em Santa Teresa, local que se torna um centro de cultura e permuta de ideias. Aí convive com intelectuais e artistas como Cecília Meireles e Murilo Mendes, entre outros. O seu desenraizamento mas sobretudo a angústia da guerra reflectem-se na sua pintura. Vieira ressente-se do clima e da distância e a obra deste período reflecte, em parte, as suas inquietações: a guerra, o absurdo do Homem, a saudade. Expõe no Museu Nacional de Belas Artes (1942) e na galeria Askanazy (1944), no Rio de Janeiro. Após a reserva da crítica brasileira, é a vez de Paris ver os trabalhos de Vieira no Salon des Réalités Nouvelles de 1945. No ano seguinte, Jeanne Bucher organiza a sua primeira exposição individual em Nova Iorque, na Marian Williard Gallery. 1947 marca o regresso a Paris e o progressivo reconhecimento do seu trabalho, reforçado pela aquisição de La partie d’échecs pelo Estado francês, em 1943, e pela monografia que lhe é dedicada em 1949, por Pierre Descargues, editada pelas Presses Littéraires de France, na colecção «Artistes de ce Temps». Inicia-se, na década de 50, a participação em exposições importantes em França e no estrangeiro (Estocolmo 1950, Londres 1952, São Paulo 1953, Basileia e Veneza 1954, Caracas 1955, Londres 1957, Kassel 1959, entre outras) e a sua pintura toma um lugar de primeiro plano. O final da década é marcado pelo profundo envolvimento de Vieira e Arpad com as suas pesquisas plásticas. Constroem uma casa-atelier na rue de l’Abbé-Carton para onde se mudam em 1956, ano em que Vieira e Arpad obtêm a nacionalidade francesa. O Estado francês adquire obras suas e atribui-lhe várias condecorações, sendo a primeira em 1960 (Chevalier de l’Ordre des Arts et des Lettres). Vieira da Silva acumula vários prémios internacionais. A partir de 1958 organizam-se retrospectivas da sua obra: Hanover e Bremen 1958, Grenoble e Turim 1964, e em 1969-1970 em Paris, Roterdão, Oslo, Basileia e Lisboa (Fundação Calouste Gulbenkian). Em Portugal, Vieira da Silva expõe na Fundação Calouste Gulbenkian em 1977, na galeria EMI-Valentim de Carvalho em 1984 e na galeria 111 em 1985. Em 1983, o Metropolitano de Lisboa propõe-lhe a decoração da estação da Cidade Universitária. Vieira da Silva escolhe uma obra de 1940, Le Métro, para reproduzir em azulejos e conta com a colaboração do pintor Manuel Cargaleiro. Em 1985 Arpad Szenes morre. Vieira confessa perceber melhor a pintura do marido agora, após a sua morte, e retoma a sua pintura. Em 1988 o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian e o Centre Nacional des Arts Plastiques apresentam, em Lisboa e em Paris, uma importante exposição das suas obras. Nessa ocasião, é condecorada pelo Estado português e pelo Estado francês. Em 1989, a Casa de Serralves no Porto organiza uma exposição de obras de Vieira da Silva e de Arpad Szenes nas colecções portuguesas. Em 1990, em Lisboa, é criada a Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva cujo Museu, dedicado à obra dos dois pintores, foi inaugurado em 1994. Em 1991, a pedido da pintora, é fundado o Comité homónimo, em Paris. Vieira da Silva morre a 6 de Março de 1992, em Paris. O Catálogo Raisonné da sua obra foi lançado na Fundação no mesmo ano. Pintora da Segunda Escola de Paris, Maria Helena Vieira da Silva teve um papel fundamental no panorama da arte internacional.

Monografias

Vieira da Silva nas colecções internacionais: em busca do essencial. Lisboa: Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva, 2004.

DESCARGUES, Pierre - Vieira da Silva. Paris: Les Presses Littéraires de France, 1949.

SOLIER, René - Vieira da Silva. Paris: Le Musée de Poche, 1956.

FRANÇA, José-Augusto - Vieira da Silva. Lisboa: Artis, 1958.

WEELEN, Guy - Vieira da Silva. Paris: Fernand Hazan, 1960.

VALLIER, Dora - Vieira da Silva. [Paris]: Ed. Weber, 1971.

WEELEN, Guy - Vieira da Silva. Paris: Fernand Hazan, 1973.

TERRASSE, Antoine – L’ Univers de Vieira da Silva. Paris: Henri Scrépel, 1977.

WEELEN, Guy - Vieira da Silva: les estampes: 1929-1976. Paris: Arts et Métiers Graphiques, 1977.

BESSA-LUÍS, Agustina – Longos dias têm cem anos, presença de Vieira da Silva. Lisboa: INCM, 1978.

PHILIPE, Anne - L'eclat de la lumière: entretiens avec Maria Helena Vieira da Silva et Arpad Szenes. Paris: Gallimard, 1978.

WEELEN, Guy, ; LASSAIGNE, Jacques - Vieira da Silva. Barcelona: Polígrafa; 1978; Paris: Ed. Cercle d'art, 1987.

BUTOR, Michel - Vieira da Silva: peintures. Paris: La Difference, 1983.

WEELEN, Guy, - Vieira da Silva: oeuvres sur papier. Paris: La Difference, 1983.

CESARINY, Mário - Vieira da Silva - Arpad Szenes ou o castelo surrealista: pintura de Vieira e de Szenes nos anos 30 a 40 em Lisboa. Lisboa: Assírio e Alvim, 1984.

BOZO, Dominique [et al.] - Vieira da Silva. Genebra: Skira, 1988.

ROY, Claude - Vieira da Silva. Barcelona: Polígrafa; 1988.

WEELEN, Guy, ; JAEGER, Jean-François ; DAVAL, Jean-Luc ; BÉRAN, Diane Daval ; DUVAL, Virginie - Vieira da Silva: monographie. Genebra: Skira, 1993.

WEELEN, Guy, ; JAEGER, Jean-François ; DAVAL, Jean-Luc ; BÉRAN, Diane Daval ; DUVAL, Virginie - Vieira da Silva: catalogue raisonné. Genebra: Skira, 1993.

MUSÉE DES BEAUX-ARTS DE ROUEN - Vieira da Silva: collections du centre Georges Pompidou et du Fonds National d'Art Contemporain. Rouen: Musée des Beaux-Arts, 1994.

NOËL, Bernard - Vieira da Silva. Creil: Bernard Dumerchez, 1994.

ROSENTHAL, Gisela - Vieira da Silva: 1908-1992: à procura do espaço desconhecido. Ed. em português. Colónia: Tashen, 1998.

FONDATION DINA VIERNY-MUSÉE MAILLOL, org. - Maria Helena Vieira da Silva. Paris: RMN: Daval Editeur, 1999.

Artigos

GRENIER, Jean - Vieira da Silva  In: L'oeil. - Lausanne: Sedo S.A., [1955 -]. - N. 14 (Février 1956), 12-19.

FRANÇA, José-Augusto - Vieira da Silva: 1958 In: Colóquio: artes. - Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. - 2.ª série, n.º 77 (Junho 1988), 5-13.

LOURENÇO, Eduardo - Itinerário de Vieira da Silva ou da poesia como espaço: a propósito da exposição retrospectiva de Grenoble 64 In: O tempo e o modo. - Lisboa : [s.n.], 1965. - n. 24 (Fev. 1965), 199-209.

AGUILAR, Nelson Alfredo - Vieira da Silva no Brasil In: Colóquio: artes. - Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. - 2.ª série, n.º 27 (Abril 1976), 6-15.

DUBY, Georges - Vieira da Silva dans le mouvement de l'Histoire In: - XXe siècle. - Paris: XXe Siècle, 1977. - 48 (Juin 1977), pp. 40-45.

LÉGLISE-COSTA, Pierre - Conversation avec Maria Helena Vieira da Silva In: Chandeigne, Michel - Lisbonne. - Paris: Autrement, 1988, pp. 78-81.

ROSENTHAL, Gisela - Maria Helena Vieira da Silva: a la búsqueda del espacio desconocido In: Humboldt. - Bonn: Inter Nationes. - 0018-7615. - Ano 38, n. 118 (1996), 40-43.

RUIVO, Marina Bairrão - Vieira da Silva In: Arpad Szenes / Vieira da Silva. Aveiro: Câmara Municipal, 2000., pp. 9-13.

CABRAL, Isabel Matos Dias Caldeira ; ALMEIDA, Inês Barahona de Almeida - Telas e teias. Vieira tecedeira e a poesia de Sophia In: - Ferreira, Maria Luísa Ribeiro, org. - Colóquio As Teias que as Mulheres Tecem. - Lisboa: Colibri, 2003, pp. 39-72.

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