por Suzanne Daveau
Orlando Ribeiro, Renovador da Geografia em Portugal
Um longo hiato, durante o qual a Geografia foi muito pouco praticada em Portugal, seguiu-se ao florescimento brusco mas breve que tinha conhecido no século XVI, pela obra de alguns brilhantes geógrafos exploradores. Nem os Jesuítas, nos seus colégios, nem os reformadores dos séculos XVIII e XIX deram verdadeira importância a esta ciência, considerada auxiliar da História. Apenas trabalharam alguns corógrafos compiladores, mas a Geografia não tinha lugar na Universidade.
Alguns precursores apareceram nos fins do século XIX: o engenheiro florestal Barros Gomes, o oficial do Exército Gerardo Pery, o médico Silva Telles. Mas será apenas em 1922, quando Amorim Girão se doutorou em Geografia em Coimbra e desenvolveu aí a sua obra original, que a Geografia ganhou realmente uma dimensão universitária, mas sem sair de um quadro regional e nacional.
Deve-se a Orlando Ribeiro a criação de um novo foco, em Lisboa, que atingiu logo dimensão e fama internacional. Ainda estudante, sentiu a necessidade em alargar a formação recebida, frequentando as aulas dos melhores professores em diversas ciências, ajudando o velho Leite de Vasconcellos na preparação da sua obra, trabalhando no campo sob a direcção do geólogo suiço Fleury. Não hesitou em seguir para Paris, em 1937, como Leitor de português, aproveitando para alargar e aprofundar a sua formação em Geografia, História e Geologia e para participar, em 1938, no Congresso Internacional de Geografia de Amesterdão.
Voltando para Portugal em 1940, nomeado sucessivamente Professor em Coimbra e Lisboa, cria em 1943 o Centro de Estudos Geográficos, publica em 1945 a brilhante síntese Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico (na sua 7ª edição, continua hoje um dos textos básicos da cultura portuguesa), organiza em 1949 o primeiro Congresso Internacional de Geografia do pós-guerra, ocasião de abundantes publicações de difusão internacional (4 volumes de Actas e 6 Livros-guias das excursões, escritos em francês).
Nos anos seguintes viaja muito através do Mundo, em especial pelos países tropicais marcados pela Expansão ibérica, ganhando assim uma vasta experiência que lhe permite entender melhor a originalidade de "Um Povo na Terra". Quando uma reforma curricular permite, enfim, que afluam alunos ao curso de Geografia, vê juntarem-se jovens esperançosos ao pequeno grupo dos primeiros discípulos, oriundos de horizontes universitários muito variados, que tinha reunido por ocasião do Congresso de 1949. Manda estagiar estes jovens em diversos centros vivos de investigação, em França, Alemanha, Suécia, Inglaterra e Estados Unidos, para incentivar, alargar e fortalecer as suas diversas vocações.
Entretanto, prossegue as próprias investigações, aprofundando também os temas que mais interessam à orientação das teses dos discípulos, aos quais deixa, no entanto, uma total liberdade, acompanhada de uma forte exigência de rigor metodológico. Praticando a máxima de ser "um investigador que ensina", orienta pelo exemplo e não pela imposição. Organiza e dirige numerosas excursões, nacionais e internacionais, procurando sempre os profícuos confrontos de ideias e experiências. Aproveita todas as oportunidades para alargar a presença dos geógrafos na vida nacional e os seus discípulos encontram-se, em breve, a ensinar em várias escolas superiores e em novas Universidades.
Mas as suas relações com as autoridades governativas e afins conservaram-se sempre tensas. A habitual frontalidade de expressão das suas opiniões fez com que, ainda que cientificamente respeitado, tenha sido considerado quase sempre incómodo e sistematicamente afastado dos órgãos de decisão. Não teve, portanto, o papel que podia ter tido na renovação do ensino e da investigação, e na reorganização do País. Mesmo as honras oficiais, que coroam normalmente uma obra científica ímpar e reconhecida internacionalmente, apenas apareceram muito tardiamente. A sua obra tem de descobrir-se nas suas abundantes publicações e nas realizações dos seus inúmeros discípulos, geógrafos mas também praticantes de muitas outras actividades, que aprenderam com ele, quer a ouvi-lo, quer a lê-lo.
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Bibliografia
A lista bibliográfica da obra científica de Orlando Ribeiro já foi publicada, em duas partes:
Ana Amaral e Ilídio do Amaral, Bibliografia Científica de Orlando Ribeiro, Centro de Estudos Geográficos, Lisboa, 1984, 85 p. [bibliografia anotada, que cobre os anos 1934-1981 e inclui 296 números].
Suzanne Daveau, "Bibliografia Científica de Orlando Ribeiro (2ª parte, 1981-1995)", Finisterra, CEG, Lisboa, 61, 1996, pp. 87-97 [cobre os anos 1981 a 1995 e atinge o número 363].
Em 1997-98 publicaram-se 5 obras, em reedição ou inéditas, 2 estão no prelo e algumas esperam ainda editor.
Destacam-se a seguir as publicações mais importantes:
1937 - "A Arrábida. Esboço geográfico", Revista da Faculdade de Letras, Universidade de Lisboa, p. 51-131.
1945 - Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico, Coimbra Editora, Coimbra, VIII + 246 p; 7ª edição, 1998, Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa, 189 p.; edição ilustrada com fotografia de Jorge Barros, 1993, Edições João Sá da Costa, 223 p.
1949 - L'Île de Madère. Etude Géographique, UGI, Lisbonne, 175 p.; tradução portuguesa, 1988: A Ilha da Madeira até Meados do Século XX, ICALP, Lisboa, 139 p.
1949 - Le Portugal Central, UGI, Lisbonne, 180 p.
1954 - A Ilha do Fogo e as suas Erupções, Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, 319 p. ; 2ª edição, 1960; nova edição, Comissão Nacional para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 1998.
1955 - Portugal, Montaner y Simón, Barcelona, 290 p. (tomo V de Geografia de España y Portugal)
1960 - Atitude e Explicação em Geografia Humana, Galaica, Porto, 71 p.; tradução francesa: "Conception et interprétation en Géographie humaine", Cahiers de Géographie du Québec, 11, 1961-62, p. 5-37.
1961 - Geografia e Civilização. Temas portugueses. Centro de Estudos Geográficos, Lisboa, 238 p.; 2ª edição, 1979, Livros Horizontes, Lisboa, 161 p.
1962 - Aspectos e Problemas da Expansão Portuguesa, Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, 213 p.; edição ilustrada de parte do texto, 1994, Edições João Sá da Costa, com o titulo: Originalidade da Expansão Portuguesa, 159 p.
1964 - Problemas da Universidade, Livraria Sá da Costa Editora, 114 p.
1968 - Mediterrâneo. Ambiente e Tradição, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 273 p.; 2ª edição, 1987; tradução italiana, Il Mediterrâneo. Ambiente e Tradizione, Murcia, Milano, edições de 1972, 1976 e 1983.
1970 - A Evolução Agrária no Portugal Mediterrâneo, Centro de Estudos Geográficos, Lisboa, 226 p.
1970 - Variações sobre Temas de Ciência, Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa, 269 p.
1973 - La Zone Intertropicale Humide, Armand Colin, Paris, 276 p. (em colaboração com Suzanne Daveau).
1977 - Introduções Geográficas à História de Portugal, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 230 p.
1981 - A Colonização de Angola e o seu Fracasso, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 459 p.
1985-86 - Les Bassins de Lousã e d'Arganil. Recherches Géomorphologiques et Sédimentologiques sur le Massif Ancien et sa Couverture à l 'Est de Coimhra, I. Le Bassin Sédimentaire, II. L'Évolution du Relief, Centro de Estudos Geográficos, Lisboa, 231 p; 450 p. (em colaboração com Pierre Birot e Suzanne Daveau).
1986 - Iniciação em Geografia Humana, Edições João Sá da Costa, Lisboa, 194 p.
1987 - Introdução ao Estudo da Geografia Regional, Edições João Sá da Costa, Lisboa, 148 p; 2" edição, 1995.
1988 - A Formação de Portugal, ICALP, Lisboa, 134 p.
1987-91 - Geografia de Portugal (em colaboração com Hermann Lautensach e Suzanne
Daveau, I. A Posição Geográfica e o Território, II. O Ritmo Climático e a Paisagem; III. O Povo Português; IV. A Vida Económica e Social, Edições João Sá da Costa, Lisboa, 1340 p.
1989-91 - Opúsculos Geográficos, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, I. Síntese e Método, 409 p.; II. Pensamento Geográfico, 448 p.; III. Aspectos da Natureza, 356 p.; IV. O Mundo Rural, 432 p.; V. Temas Urbanos, 560 p.; VI. Estudos Regionais, 497 p. (Os Opúsculos Geográficos reúnem 179 artigos, dos quais 47 inéditos.)
1994 - Finisterra, Encontros de Fotografia, Coimbra, (fotografias, com textos de Teresa Siza, Jorge Gaspar e Suzanne Daveau).