Adolfo Coelho
Alexandre Herculano
Almeida Garrett
Antero de Quental
António Nobre
Basílio Teles
Eça de Queirós
Gomes Leal
Jaime Batalha Reis
Lopes de Mendonça
Moniz Barreto
Oliveira Martins
Pinheiro Chagas
Rafael Bordalo Pinheiro
Rebello da Silva
Teófilo Braga
Abel Salazar
Adérito Sedas Nunes
Adolfo Casais Monteiro
Agostinho da Silva
Alexandre O'Neill
António Gedeão
Aquilino Ribeiro
Augusto Abelaira
Bento de Jesus Caraça
Bernardo Marques
Borges de Macedo
Carlos Ramos
David Mourão-Ferreira
Eugénio de Andrade
Fernando Gil
Fernando Lopes-Graça
Fernando Pessoa
Fidelino de Figueiredo
Florbela Espanca
Guilhermina Suggia
Helena Vaz da Silva
Hernâni Cidade
Irene Lisboa
Jacinto do Prado Coelho
Jaime Cortesão
João Gaspar Simões
Joaquim de Carvalho
Jorge de Sena
Jorge Peixinho
José Augusto Seabra
José Cardoso Pires
José Gomes Ferreira
José Rodrigues Miguéis
Leonardo Coimbra
Lindley Cintra
Luís Albuquerque
Luís de Freitas Branco
Manuel Antunes
Manuel Viegas Guerreiro
Maria Archer
Maria de Lourdes Belchior
Maria Lamas
Mário Botas
Mário Eloy
Mário Sottomayor Cardia
Miguel Torga
Orlando Ribeiro
Paulo Quintela
Raul Brandão
Raul Proença
Sílvio Lima
Sophia de Mello Breyner Andresen
Teixeira de Pascoaes
Vergílio Ferreira
Viana da Mota
Vieira da Silva
Vieira de Almeida
Vitorino Magalhães Godinho

por Marina Bairrão Ruivo
Bernardo Marques

Bernardo Marques (1898-1962) foi autor de uma obra vastíssima e multifacetada que lhe confere um lugar de destaque na arte portuguesa contemporânea. Natural de Silves, nasceu no seio de uma família abastada. Veio para Lisboa em 1918 frequentar a Faculdade de Letras em Lisboa, que abandonou em 1921, juntamente com a sua colega de curso Ofélia Marques (1902-1952), pintora modernista que viria a ser sua mulher. No percurso da sua prática artística, que abrange o período de 1920 a 1962, é possível – apesar da diversidade das suas actividades – descortinar uma evolução inteligível, cujo fio condutor é o seu meio de expressão privilegiado, o desenho. Bernardo Marques preferiu, na sua opção pela prática do desenho, uma aprendizagem vivencial a uma formação académica e iniciou-se através do desenho humorístico, das caricaturas - de grande riqueza gráfica e decorativa - partilhando com os artistas “novos” da sua geração o desenvolvimento do modernismo durante a década de vinte. As imagens dos magazines não coincidiam com as imagens da realidade lisboeta. Lisboa, povoada de novos-ricos, era uma pequena cidade cheia de campos e lugares híbridos que Bernardo Marques retratou com um misto de ternura e de ironia. No final da década, a elegância daria lugar a uma temática mais social, e a estilização gráfica seria substituída por um traço mais violento e expressionista. Uma estadia em Berlim, em 1929, para além de lhe aguçar a percepção da estagnação da vida artística em Portugal, facultou-lhe novos meios de expressão. Os desenhos e as aguarelas de Berlim são registos de um impiedoso observador da sociedade urbana, resultam do contacto que teve com o expressionismo alemão e reflectem já um certo desencanto e amargura associados a um traço mais violento e expressionista que caracterizaram a produção dos anos que se seguiram. Ao nível da ilustração, a sua produção deste período confina-se quase exclusivamente à sua colaboração nas revistas de cinema. A influência que o cinema exerceu e o mimetismo que provocou foram explorados com humor, ironia e algum ridículo em inúmeros desenhos de Bernardo Marques: a acutilante série de cinéfilas não foi com certeza feita para ser publicada numa revista da especialidade. Estadias por outras terras (Paris, Nova Iorque, São Francisco) condicionaram, de diferentes modos, a linguagem plástica e alimentaram o poder criador do artista. De Paris resultaram desenhos mais poéticos, de registo mais atmosférico. Depois de várias viagens e experiências plásticas e humanas diversificadas, Bernardo Marques regressa a Lisboa, iniciando um percurso mais solitário e particular. Apurando-se em técnica e solidão, vai passar gradualmente da análise dos homens à análise das coisas e concentrar a sua atenção na paisagem, rural ou urbana. É assim que nasce o paisagista dos anos quarenta. Nesses anos, a sua actividade desdobrou-se entre a ilustração, as artes gráficas e a decoração, colaborando com várias editoras e aceitando encomendas oficiais do S.P.N./S.N.I., participando na renovação do gosto artístico sem por isso se enquadrar na “Política do Espírito” protagonizada por António Ferro. Nestes anos, encontramos ainda outro tipo de desenhos, de carácter onírico, simbólico e até surreal. São exemplos pontuais que demonstram o interesse por vários tipos de correntes, sem as explorar, no entanto, até à exaustão. Na década de 50 volta ao desenho como actividade autónoma, de carácter íntimo, centrando-se essencialmente na análise da paisagem urbana e rural. Esta última fase, que culminou com a sua morte em 1962, corresponde à mais íntima e é acompanhada, tecnicamente, por importantes variações de registos, cada vez mais atmosféricos. É em Lisboa, a sua cidade de eleição, que uma mudança visível do relacionamento com o que rodeia vai ter lugar. Desinteressado dos homens, Bernardo Marques transferiu para a paisagem uma atenção cada vez mais selectiva e depurada. Percorreu o país de norte a sul, numa ânsia de ao mesmo tempo conhecer toda a terra portuguesa e de encontrar, quando lhe apetecia, o isolamento e a distância que procurava. As suas errâncias afectivas são pretextos para uma riquíssima e constante experimentação plástica. Mais sensível a valores como a forma, os volumes e a luz, os seus desenhos tornam-se mais sintéticos e depurados e transmitem uma impressão de calma e de recolhimento. A delicada caligrafia de signos, em que predomina a tinta da china, como que aprisiona a essência da paisagem através de uma sobreposição de linhas e da vibração colorística do preto e branco. Ignorando as formas estéticas que surgiam, Bernardo Marques assumiu uma postura simultaneamente sensível e distanciada, transferindo para a paisagem o seu espaço de intimidade. A variação dos meios técnicos utilizados, nomeadamente a aguarela de tradição paisagística e os pictóricos desenhos caligráficos a preto e branco, sugeridos pela sua atenção imediata à paisagem, tornam a obra de Bernardo Marques ambígua e original. É uma postura sincera e legítima, surgida de circunstâncias pessoais, que se ajusta ao lirismo íntimo e contemplativo que lhe convinha e que confere modernidade à sua obra.

Bernardo Marques

O percurso que se isola e se matura no silêncio da paisagem, alheio a correntes plásticas e ideológicas, confere-lhe um certo sentido de liberdade e de independência, factor que o torna, hoje em dia, mais actual e interessante. Contemporâneo da segunda geração modernista, Bernardo Marques participou activamente na difusão do gosto moderno, sem por isso prescindir de formas de expressão muito pessoais que não se enquadravam nos padrões dominantes. Foi acima de tudo um grande desenhador.


Marina Bairrão Ruivo




Bibliografia:


Obras gerais

BARROS, Júlia Leitão de - Os «Night Clubs» de Lisboa nos anos 20. Lisboa: Lucifer Edições, 1990.

FRANÇA, José-Augusto - A arte e a sociedade portuguesa no séc. XX. Lisboa: Livros Horizonte, 1972.

-          Os quadros de «A Brasileira». Lisboa: Artis, 1973.

-          Cem Exposições. Lisboa: INCM, 1982.

-          A arte em Portugal no século XX. Lisboa: Livraria Bertrand, 1984.          

-          O Modernismo na Arte Portuguesa. Lisboa: Instituto de Cultura Portuguesa, 1987.

-          História da arte ocidental, 1780-1980. Lisboa: Livros Horizonte, 1987.

-          Os anos vinte em Portugal. Lisboa: Editorial Presença, 1992.

-          Pintura portuguesa do séc. XX: de Amadeo a 1990. Lisboa: Correios de Portugal, 1998.

FREITAS, Maria Helena de - Ilustração e grafismo nos anos 20. Tese de Mestrado em História da Arte Contemporânea, FCSH/UNL, ex. policopiado, 1986.

GONÇALVES, Rui Mário - «O imaginário da cidade de Lisboa». In: O Imaginário da cidade: compilação as comunicações apresentadas no colóquio sobre o Imaginário da Cidade realizado em Outubro de 1985. Lisboa: FCG: ACARTE, 1989.

-          Pintura e escultura em Portugal, 1940-1980. Lisboa: Instituto e Cultura Portuguesa, 1980.

GUEDES, Fernando - Estudos sobre artes plásticas. Os anos 40 em Portugal e outros estudos. Lisboa: INCM, 1985.

PORTELA, Artur - Salazarismo e artes plásticas. Lisboa: Instituto de Cultura Portuguesa, 1982.

SANTOS, Rui Afonso - «O design e a decoração em Portugal». In: História da Arte Portuguesa, v. 3 (Dir. Paulo Pereira). Lisboa: Círculo dos Leitores, 1995.

SILVA, Raquel Henriques da - «Sinais de ruptura: “livres” e humoristas». In: História da Arte Portuguesa, v. 3 (Dir. Paulo Pereira). Lisboa: Círculo dos Leitores, 1995.


Obras específicas

AZEVEDO, Fernando - «Memória de Bernardo Marques». In: Bernardo Marques, obras de 1950 a 1960. Lisboa: FCG, 1966

 - [texto de apresentação]. In: Bernardo Marques (1899-1962). Lisboa: SEIT, 1969.

 - «A Terra e o Mar na obra de Bernardo Marques». In: A Terra e o Mar. Lisboa:  FCG, 1976.

 - [texto de apresentação]. In: Bernardo Marques: a entrega de um olhar. Colares: Galeria de Colares, 1987.

 - «Bernardo Marques, do humor à contemplação». In: Bernardo Marques. Lisboa: FCG, 1989.

 - [texto de apresentação]. In: Bernardo Marques. Lisboa: Fundação Oriente, 1991.

BERNARDO MARQUES 1898-1998. Obra gráfica. Lisboa: IPM - Museu do Chiado, 1998.

BERNARDO MARQUES 1898-1962. Lisboa: CAMJAP, 1999.

CASTRO, Fernanda - «Evocação do Bernardo». In: Bernardo Marques. Lisboa: FCG: CAM, 1989.

CHICÓ, Silvia – [texto de apresentação]. In: Bernardo Marques: a entrega de um olhar. Colares: Galeria de Colares, 1987.

COSTA, Pierre Léglise - «Bernardo Marques et son espace, Sintra». In: Bernardo Marques:  a entrega de um olhar. Colares: Galeria de Colares, 1987.

ESTEVES, Juvenal - «1953, por memória». In: Bernardo Marques. Lisboa: FCG: CAM, 1989.

FERREIRA, David Mourão – [selecção de textos e prefácio]. Saudades de Lisboa: de Eça de Queiroz a Miguel Torga. Lisboa: Estúdios Cor, 1967.

FERREIRA, Paulo - «Bernardo, mon frère d’élection». In: Bernardo Marques: période 1934-1962. Paris: FCG: CCP, 1982.

FRANÇA, José-Augusto – [texto de apresentação]. In: Bernardo Marques. Lisboa: Galeria Dinastia, 1973.

-          [texto de apresentação]. In: Bernardo Marques. Lisboa: Galeria Dinastia, 1981.

-          «Introduction». In: Bernardo Marques: période 1934-1962. Paris: FCG: CCP, 1982.

-          «Bernardo Marques». In: Os anos 40 na arte portuguesa. Lisboa: FCG, 1982.

-          «Bernardo, anos 20». In: Bernardo Marques: desenho e ilustração nos anos 20 e 30. Lisboa: FCG, 1982.

-          «Breve intróito aos anos vinte». In: O grafismo e a ilustração nos anos 20. Lisboa: FCG: CAM, 1986 

FREITAS, Maria Helena de - «Imagens e miragens de uma década». In: O grafismo e a ilustração nos anos 20. Lisboa: FCG: CAM, 1986.

- «A Janela do Atelier». In: Bernardo Marques. Lisboa: FCG: CAM, 1989.

MACEDO, Diogo de - «Bernardo Marques, apontamento inédito». In: Bernardo Marques, obras de 1950 a 1960. Lisboa: FCG, 1966.

PAES, Sellés - Bernardo Marques. Lisboa: Ed. Notícias. Empresa Nacional de Publicidade, [s. d.]

PEDRO, António - «Saudades do Bernardo Marques». In: Bernardo Marques, obras de 1950 a 1960. Lisboa: FCG, 1966.

RUIVO, Marina Bairrão - [texto de apresentação e análise da obra]. In: Bernardo Marques. Lisboa: Fundação Oriente, 1991.

-          Bernardo Marques (1898-1962). Lisboa: Ed. Presença, 1993.

SEGURADO, Jorge - «Bernardo Marques decorador». In: Bernardo Marques, obras de 1950 a 1960. Lisboa: FCG, 1966.

TEIXEIRA, Luís - «Recordando Bernardo Marques». In: Bernardo Marques, obras de 1950 a 1960. Lisboa: FCG, 1966.


© Instituto Camões, 2003-2006