Teatro Livre
(Lisboa, 1904-1908)
Fundado em Lisboa por Araújo Pereira e por Luciano de Castro, em 1904, na esteira do Théâtre Libre de André Antoine (que se apresentara em Lisboa em junho de 1903), foi um dos grupos que, no início do século XX, se constituiu como um dos mais firmes indicadores de uma vontade de renovação cultural e teatral, que se “propunha dar rejuvenescimento e trazer uma nova seiva ao teatro português, infestado de retrógradas ideias” (REBELLO 2000: 120).
A maternidade, de Eugène Brieux, enc. António Pinheiro, Teatro Livre, 1905 [A Illustração Portugueza, 26-06-1905, p.539]. |
Os seus ideais na regeneração do teatro português, intimamente ligados ao realismo/naturalismo que já se fazia sentir noutras capitais, eram, no entanto, mais consistentes que as suas práticas teatrais – o que levou à dissolução do grupo ao final de apenas três épocas.
O arranque da iniciativa deu-se com um conjunto de três conferências realizadas no Ateneu Comercial de Lisboa, em dezembro de 1902, proferidas por Teófilo Braga, Heliodoro Salgado e Ernesto da Silva. A deste último, realizada a 14 de dezembro de 1902, recebeu o título de Teatro livre & Arte social, que revela o caráter progressista e libertário do grupo. Foi com claros intuitos de renovação cultural, inspirados nos princípios da estética realista e naturalista, que o Teatro Livre se apresentou no palco do Teatro do Príncipe Real, à Rua da Palma, em Lisboa, sob a direção artística de Araújo Pereira. Para o espetáculo de estreia foi escolhido um texto do repertório de Antoine, Tante Léontine, de Maurice Boniface e Edouard Boudin (em português, A moral deles) e um fragmento do prólogo dramático …Amanhã, de Manuel Laranjeira. Mais tarde, a 19 de abril de 1904, o Teatro Livre estreou ainda a peça Em ruínas, de Ernesto da Silva e o ato de Octave Mirbeau, A carteira.
Na segunda temporada (de 16 de junho a 31 de julho de 1905), então com gestão de César Porto, Luís da Mata, Adolfo Lima e Severino de Carvalho e com a direção artística de António Pinheiro, o Teatro Livre apresentou, no Teatro do Ginásio, em Lisboa, O condenado de Valentim Machado, Às feras de Manuel Laranjeira (escrita propositadamente para o Teatro Livre), Os que furam de Emídio Garcia, e Missa nova de Bento Faria. Do repertório internacional levaram à cena: A maternidade de Brieux, Confissão de amigo, adaptação de um conto de Sudermann, Pai natural de Ernest Dupré e Paul Charton, A prosa de Gaston Salandri, Uma falência de Björnson, e As vítimas de Frédéric Boutet. Esta segunda temporada, apresentada no Teatro do Ginásio, evidenciou um desvio relativamente aos propósitos anunciados pelo grupo, o que motivou um certo desfavor da crítica e o desinteresse do público – um público maioritariamente urbano e burguês.
O Teatro Livre só regressou em 1908, numa última temporada dirigida por António Pinheiro no Teatro D. Amélia, apresentando Entre dois fogos de Emídio Garcia, O triunfo de Carrasco Guerra, A gaiola de Lucien Descaves e A tranquilidade do lar de Guy de Maupassant, onde ao fulgor naturalista se substituiu já “uma corrente mística ou idealista”, concessão que se provou inconciliável com o projeto de fundo e que terá, de algum modo, precipitado o fim do grupo.
Bibliografia
COELHO, Rui Pina (2009). Casa da Comédia (1946-1975): um palco para uma ideia de teatro. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda.
MADUREIRA, Joaquim (1905). Impressões de theatro (cartas a um provinciano e notas sobre o joelho). 1ª série (1903-1904). Lisboa: Ferreira & Oliveira, Lda. Editores.
PINHEIRO, António (1929). Contos largos... (impressões da vida de teatro) – 1900-1925. Lisboa: Tip. Costa Sanches / Sucessores Galhardo & Costa, Ltd.
REBELLO, Luiz Francisco (2000). Breve história do Teatro português. 5ª edição. Lisboa: Publicações Europa-América, pp. 119-122.
___ (2005). “Um duplo centenário: o ‘Teatro Livre’ e o ‘Teatro Moderno’” in Sinais de cena, nº.3, Junho, pp.57-60.
REBELLO, Luiz Francisco / FADDA; Sebastiana (2010). “Transformar pela arte, redimir pela educação”, in Sinais de cena, n.º14, Dezembro, pp. 119-128.
SILVA, Ernesto da (1902). Teatro livre & arte social. Lisboa: Tipografia do Comércio.
Consultar a ficha de instituição na CETbase:
http://ww3.fl.ul.pt/CETbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Instituicao&ObjId=9480
Consultar imagens no OPSIS:
Rui Pina Coelho/Centro de Estudos de Teatro