Teatro Nacional D. Maria II
(Praça D. Pedro IV, 1100-201 Lisboa, Portugal)
Inaugurado a 13 de abril de 1846 por ocasião do 27º aniversário da rainha D. Maria II, o Teatro Nacional foi instituído legalmente 10 anos antes pela portaria régia de 15 de novembro – assinada pelo ministro do reino, Passos Manuel.
Teatro Nacional D. Maria II (fachada), 1933-1983, fot. Estúdio Mário Novais [cortesia da Fundação Calouste Gulbenkian]. |
Edificado nos escombros do Palácio dos Estaús (consumido por um incêndio em 17 de Julho de 1836), onde funcionara a sede do Tribunal do Santo Ofício, este edifício, construído no topo norte do Rossio em estilo neoclássico pelo arquiteto italiano Fortunato Lodi (1805-1883), teve em Almeida Garrett (a par de Joaquim Larcher) o seu maior idealizador, responsável ainda por outras instituições que surgiram no século XIX.
A ideia de criação de um edifício que acolhesse os dramas nacionais surgiu da vontade de alguns literatos de equiparar a nação a outras da velha Europa que tinham já enraizada a tradição de apresentar ao seu público um leque dramatúrgico adequado à sua realidade. Urgia assim “desafrancesar o teatro” português (SEQUEIRA 1955: 47) e criar um repertório romântico – corrente tendencial – com propósitos nacionais para o público português que se queria também ele mais instruído, crítico e seletivo. No entanto, Portugal tinha já pelo menos dois teatros que se digladiavam pelo epíteto de “Teatro Nacional”. Eram eles o Teatro da Rua dos Condes (1765) e o Teatro do Salitre (1782) – “que igualmente se nomeava[m] de “Portuguez”, “Nacional” e “Real” (SEQUEIRA 1955: 20) – mas que, pelo seu repertório, estavam longe de ser teatros portugueses. Assim, incumbiu-se Luigi Chiari da apresentação de um projeto para o novo teatro onde seriam postos em cena dramas originais portugueses simultaneamente aprovados pelo júri do Conservatório. Foi, no entanto, posteriormente descartado por se revelar excessivamente dispendioso. Vários foram os terrenos cogitados para a construção do edifício, mas o já existente conflito de interesses e o escasso orçamento impediam uma decisão definitiva. Decidiu-se então pelo terreno do Rossio pelo qual a Câmara pediu 19 contos de reis.
A vaga romântica e a valorização do que era nacional marcavam o panorama cultural e fizeram com que a escolha final do italiano Fortunato Lodi para o projeto arquitetónico do Teatro Nacional não fosse consensual. Almeida Garrett foi um dos que se insurgiu contra esta nomeação, mas Lodi, enquanto cunhado do conde de Farrobo, era uma “escolha” obrigatória (ainda que não se tivesse submetido ao concurso). Duramente criticado pelos arquitetos concorrentes durante a edificação do teatro, que começou em 1843, o italiano modificou a planta original do edifício inúmeras vezes, muito também por sugestão dos professores da Academia de Belas Artes que com ele colaboraram na parte escultórica do edifício, nomeadamente Francisco de Assis Rodrigues e António Manuel da Fonseca. Desta intervenção surgiu o baixo-relevo “Apolo e as Musas” – que viria a decorar o interior do frontão triangular apenas no ano seguinte à inauguração –, bem como a estátua de Gil Vicente e as figuras da Tragédia (Melpomene) e da Comédia (Tália), que passariam a figurar apenas em 1848. O pórtico de seis colunas jónicas, trazidas do convento de S. Francisco, sugere um templo romano que, repleto de iconografia mitológica, é encimado pela estátua do pai do teatro português. Projetado inicialmente para mais de um milhar e meio de pessoas, este edifício neoclássico possuía, no interior da sala de espetáculos, tubos acústicos para os espetadores poderem chamar os criados do botequim do teatro.
Alguns dos problemas apontados pelos arquitetos acabaram por se revelar fatais, nomeadamente o problema das infiltrações. O facto de as fundações do teatro terem sido edificadas em terreno alagadiço fez com que os opositores da obra do bolonhês alcunhassem o teatro de “agrião”. A acústica da sala também se mostrou um problema complicado, uma vez que, no dia da estreia da peça inaugural do teatro – Álvaro Gonçalves, o Magriço, ou os Doze de Inglaterra (drama histórico em cinco atos), de Jacinto Heliodoro de Loureiro, aprovada pelo júri do Conservatório para este fim – o público não conseguiu ouvir os atores que, de resto, também não agradaram à plateia. Os meses que se seguiram à inauguração não foram particularmente profícuos para o novo teatro lisboeta, reflexo da agitação política que então se vivia. Nem o facto de este teatro ter a primazia nas representações (sendo os outros teatros obrigados a fechar portas em dias de récita) fez com que o público respondesse com a sua adesão. Surgiram, assim, inevitáveis críticas à sua direção e, em 1853, o Estado foi obrigado a assumir a administração direta do teatro. Reflexo das sucessivas mudanças, rivalidades e legislações avulsas que sofreu, foram também constantes as alterações de nome: idealizado como “da Glória”, principiou como “Normal”, passou a “Nacional” e, na sequência da implantação da República, pela portaria de 6 de dezembro de 1910, “Teatro Nacional Almeida Garrett”, prestando assim homenagem ao seu maior mentor. Gerido, por um largo período, por sociedades de artistas como a Rosas & Brazão e a Rey Colaço-Robles Monteiro, teve com esta última a sua mais longa gestão (de 1929 a 1964). Foi durante a administração de Amélia Rey Colaço que, em dezembro de 1964, o teatro foi destruído por um incêndio, obrigando a companhia a retirar-se para outro espaço, deixando para trás todos os seus pertences, transformados então em cinzas. Renovado e reconstruído por Guilherme Rebelo de Andrade e pelo seu filho Ruy Rebelo de Andrade (respeitando os traços gerais do projeto original), o Teatro Nacional voltou a abrir portas a 11 de maio de 1978 (com as peças Auto da geração humana, de Gil Vicente e O Alfageme de Santarém, de Almeida Garrett), não sem as habituais críticas e algumas novidades: as oficinas de construção de cenários passaram a ser subterrâneas e o palco rotativo e com um elevador. No último piso encontra-se a Sala Estúdio que hoje abriga produções mais pequenas.
Considerado imóvel de interesse público, atualmente, o Teatro Nacional de D. Maria II, Entidade Pública Empresarial (E.P.E.), “é dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, que está sujeita aos poderes de superintendência e tutela dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da cultura”, conforme se pode ler no sítio eletrónico da instituição.
Bibliografia
AA.VV. (1973). Monumentos e edifícios notáveis do distrito de Lisboa. Vol. 5, 1º tomo: Junta Distrital de Lisboa.
CARNEIRO, Luís Soares (2003). Teatros portugueses de raiz italiana. Tese de Doutoramento apresentada à Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (texto policopiado).
GAMEIRO, Luís (2011). António Pinheiro: Subsídios para a história do teatro português. Dissertação de Mestrado em Estudos de Teatro apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (texto policopiado).
SEQUEIRA, Gustavo de Matos (1955). História do Teatro Nacional D. Maria II: Publicação comemorativa do centenário 1846-1946. 2 vols. Lisboa: Oficinas Gráficas de Ramos, Afonso & Moita.
Sitiografia
Consultar a ficha de espaço na CETbase:
http://ww3.fl.ul.pt/CETbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Espaco&ObjId=35
Consultar imagens no OPSIS:
Andreia Brito Silva/Centro de Estudos de Teatro